quinta-feira, 1 de julho de 2010

A ENERGIA DA POESIA


A Mãe do Vento
Teresa Vergani

Estrelejar conjuga-se como gotejar ou irisar.
Vivem densidades luminescentes tão ocultas
que atiram o seu ponto de fusão
para o lado do arco-íris que não vemos.

O luar é um vento irisado derramando-se
em pérolas fluídas a latejar concêntricas.
A lua um manso redemoinho circular com a paz
muito húmida lá dentro a amadurecer
e a desaparecer de tempo em tempo.

O vento precede-nos envolve-nos e devolve-nos,
mais íntimo que a linguagem que nos moldou a voz.
Se nos deflagra e nos desdobra é porque brinca
empurrando sementes até aos olorosos rumos da flor.

Incansável sopro que nos cala e nos leveda o fôlego,
engendrando fala gosto corpo pensamento
ao seu jeito nimbado de constância flexível (desviante).

Damos nomes às coisas porque precisamos de
as estabilizar, de multifacetar o nome único do vento.
Assim as subtraímos à mutância incandescente do que são
(cada uma colada à límpida raiz móvel do seu vento).

Parido por que mãe, o vento que nos nasce?
Haverá nome capaz de criar a conjunção útero correnteza?

Ondas gazelas peixes pólen neblinas, todos os fogos se
acendem no caudaloso espaço desmedido desse imperceptível
caroço transparência, lugar de fluidez sem poiso (desarmado).

Se não sabemos Encontrar nem Desejar
é porque o nosso medo parou o Grande Vento.
De que seiva o roubámos ao negar-lhe
a via-Vida tumultuosamente láctea e cadente?

Tocado a 4 mãos a 4 passos, que começo criará que fim?
Que morte sangue e leite (aparição de esperma ou lágrima)
fora da tão áspera inteira e maternal nudez do vento?

Somos o tempo: a chaga nómada dessa
espantosa cratera deslizante, a assustada pequenez
onde se afunda ileso o vento em carne viva.

Que grito ou fome ou canto consentirá
transfigurar-se no universo deste entendimento?
(Sim, Entendi Vento!...)

A onde então? nem dentro nem fora,
dentro e fora, a sobejar e a contrair
o ondulante limite fraccional de cada forma,
fiel e infiel à descerteza.

Será o Vento orfão? talvez não.
Se um dia me deixar tocar pelo sabor
da mais penetrante e matricial inteligência,
então serei talvez sem chão nem céu nem parte.

Então serei só isso: Novidade isenta de tormento,
a esfacelada a indivisa a intensa a exultante
– A de Pé, A Mãe do Vento.

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