sexta-feira, 2 de julho de 2010

A ENERGIA DE SPINOZA: SUPERSTIÇÃO, DEUS E O ERRO JUDAICO-CRISTÃO

“Pela decisão dos anjos e julgamento dos santos, excomungamos, expulsamos, execramos e maldizemos Baruch de Spinoza... Maldito seja de dia e maldito seja de noite; maldito seja quando se deita e maldito seja quando se levanta; maldito seja quando sai, maldito seja quando regressa... Ordenamos que ninguém mantenha com ele comunicação oral ou escrita, que ninguém lhe preste favor algum, que ninguém permaneça sob o mesmo teto ou a menos de quatro jardas, que ninguém leia algo escrito ou transcrito por ele.” (parte do texto de excomunhão de Spinoza pela comunidade judaica de Amsterdã a 27 de julho de 1656)

A filosofia de Spinoza é uma crítica da superstição em todas as suas formas: religiosa, política e filosófica. A superstição é uma paixão negativa nascida da imaginação que, impotente para compreender as leis necessárias do universo, oscila entre o medo dos males e a esperança dos bens. Dessa oscilação a imaginação forja a ideia de que o homem é um joguete de uma Natureza caprichosa, concepção que é projetada num ser supremo e todo-poderoso que existiria fora do mundo e o controlaria segundo o seu capricho: Deus.
Nascida do medo e da esperança, a superstição faz surgir uma religião onde Deus é um ser colérico ao qual se deve prestar culto para que seja sempre benéfico. A superstição cria uma casta de homens que se dizem intérpretes da vontade de Deus, capazes de oficiar cultos, profetizar eventos e invocar milagres. A superstição engendra, portanto, o poder religioso que domina a massa popular ignorante.
Toda filosofia que tentar explicar a Natureza apoiada da ideia de um Deus transcendente, voluntarioso e onipotente, não será filosofia, será apenas uma forma refinada de superstição.

Em sua obra Spinoza procura mostrar de que modo Deus se produz a si mesmo, às coisas e ao homem, demonstrando que esse modo de autoprodução é o próprio modo de produção do real. Com isso, elimina a principal ideia sustentáculo da teologia e da filosofia cristãs: a ideia da criação, isto é, um Deus pré-existente que tira o mundo do nada.
Deus é a Substância (do latim substantia: essência), ou seja, o Ser que é causa de si, que existe em si e por si, que é concebido em si e por si e que é constituído por infinitos atributos, infinitos em seu gênero e cada um deles exprimindo uma das qualidades infinitas da substância. Deus é a própria Natureza.

Para o filósofo, o erro é uma abstração. O erro não é uma ausência de conhecimento, mas um conhecimento parcial ou mutilado da totalidade, isto é, abstrato (separado). O erro consiste em anexar conhecimentos parciais para querer retirar daí um conhecimento geral, e este será, também, abstrato na medida em que resulta de uma simples justaposição de realidades.

Em sua obra Ética, a expressão Deus ou Natureza tem vários significados: 1. o ato pelo qual Deus se produz é o ato pelo qual produz as coisas; 2. Deus é a causa de si mesmo e das coisas como causa imanente e não transcendente; 3. a produção divina não visa fim algum, é o seu próprio fim, ou seja, entre o ato de produção e o produto não há distância a separá-los, são uma só e mesma coisa. Separar o produtor do produto é aceitar a incompreensibilidade divina, o mistério da criação e o mistério da Natureza. É ser vítima da superstição. É ter uma compreensão alienada da produção, pois ao separar o produtor do produto, este não permite mais identificar seu produtor e o homem passa a imaginar o produtor possível, acabando por chegar ao Deus voluntarioso, que tudo governa para e segundo seus caprichos.

E por aí vai...

Para saber mais: “Pensamentos Metafísicos: tratado da correção do intelecto; ética" – Editora Nova Cultural – ISBN 8513002380

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